Nossos Vídeos

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

ENSINO DE HISTÓRIA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA


O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
Enviado por: "Veronica Maia" veronicamaia1@gmail.com
Qua, 29 de Ago de 2007 2:47 pm
*O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana *

* *

*Verônica Lemos de O. Maia**

* *

A Lei 10.639, de 2004, institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana. Determina também a inclusão da Educação das
Relações Étnico-Raciais nas instituições de ensino superior, nos conteúdos
de disciplinas e atividades curriculares dos cursos que ministram e o
tratamento de questões e temáticas que dizem respeito aos afro-descendentes.

A meta dessa Lei é promover a educação de cidadãos atuantes e conscientes no
seio da sociedade multicultural e pluriétnica do Brasil para buscar relações
étnico-sociais positivas à uma nação democrática.

Os objetivos da Educação das Relações Étnico-Raciais são a divulgação e
produção de conhecimentos, de atitudes, posturas e valores que eduquem
cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de
interagir e de negociar objetivos comuns que garantam a todos o respeito aos
direitos legais e a valorização de identidade. E também, a valorização das
raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas, européias,
asiáticas e reconhecimento da história e da cultura dos afro-brasileiros.

A Lei recomenda a obrigação dos sistemas de ensino de proverem condições
materiais e financeiras com materiais didáticos necessários para tornar
práticos seus preceitos. E indica movimentos civis organizados e
instituições que possam ser consultados sobre conteúdos e metodologias úteis
para a aplicação da Lei. Ela reafirma uma posição de combate ao racismo e à
discriminação, de acordo com a nossa Constituição.

Para qualquer educador que tenha juízo e seja realista, essa Lei significará
principalmente um chamado ao trabalho, pois sabemos que o Estado ainda não
poderá prover o sistema de ensino com os meios necessários para dar plena
eficácia à Lei. Pode até parecer difícil, à primeira vista, saber como e por
onde começar. Mas, diante da montanha de fatos, personagens e circunstâncias
históricas que têm sido negligenciados como conhecimento ao longo da
história da Educação no Brasil, essa dificuldade é só aparente. Ao
começarmos a tratar do tema vamos descobrir um outro país.

A história do Brasil e a formação do povo brasileiro foram de tão reduzidas
a esquemas simplificados no dia a dia das escolas que nossos alunos chegam a
terminar o Ensino Superior sem conhecer a História do Brasil. Nada, ou
quase nada, estudamos sobre a política portuguesa de povoamento da colônia,
que estimulava a mestiçagem para acelerar a ocupação das terras; ou sobre a
resistência indígena ao formato hierarquizado das populações dominadoras; ou
sobre a política de estado praticada por alguns reinos africanos que
institucionalizaram a venda e a exportação de escravos negros; ou sobre a
força antiabolicionista dos republicanos no Brasil. Isso simplesmente não é
visto nas escolas. Repetimos expressões carregadas de significado histórico
sem nem suspeitarmos disso, como aquela que diz que algo é "para inglês ver"
e que se refere à burla da ordem baixada pelos ingleses de proibição do
tráfico negreiro.

Às vezes estamos muito próximos de referências históricas importantes e não
percebemos, nem tampouco nos alertam para isso na escola. Quando ouvimos O
Guarani, de Carlos Gomes, na abertura da Hora do Brasil, por exemplo, é sem
saber que o nosso mais conhecido compositor erudito era neto de uma escrava
fôrra. Também não nos damos conta de que o nome Rebouças que batiza viadutos
e avenidas nas maiores cidades brasileiras homenageia o sobrenome de uma
ilustre família de políticos baianos negros, do século XIX, cujos membros
foram importantes engenheiros: os irmãos André e Antônio Pereira Rebouças
Filho, construtores de ferrovias e obras de grande porte.

Conhecer melhor sobre os afro-descendentes que fogem ao estigma da
escravidão mais do que saciar curiosidades, nos ensina que, desde cedo, esse
brasileiros impuseram, com sua existência, o fato de que a cor jamais os
condenou à inferioridade intelectual. Apesar do ambiente que lhes era
desfavorável eles alcançaram admiração e respeito assim como muitos outros
que lutaram pela conquista de seu espaço.

O que vamos encontrar na busca de fazer a Lei 10.639 ser colocada em prática
são personalidades, revoltas, movimentos relevantes na História do Brasil
cujas origens negras foram escamoteadas, omitidas e até veementemente
negadas pela ideologia de valorização do "branqueamento" de
afro-descendentes que prevaleceu até recentemente na visão eurocêntrica
praticada no Brasil.

Nas palavras do antropólogo Marcel Mauss: "o escravo não tem personalidade.
Não tem corpo, não tem antepassado, nem nome, nem cognome, nem bens
próprios. O escravo, entendido como corpo sem *persona* é, por definição, o
próprio vazio social."
[1]< http://mail.google.com/mail/?ik=f09f545a23&view=cv&search=inbox&th=114a96bd678f1f9a&ww=1003&lvp=2&cvp=2&qt=&zx=7zz827-s49c26#_ftn1>

Destituído da condição humana, o escravo tornou-se invisível como pensamento
e como sentimento. Falar de cultura negra afro-descendente no Brasil, por
muito tempo, foi falar do passado e da escravidão. Sobre as atrocidades da
escravidão ouvimos muito, pois felizmente elas têm sido amplamente
reconhecidas e divulgadas. Por outro lado, pouco sabemos sobre a
resistência, a sofisticação, o combate à exploração, à segregação, à
discriminação social. São pontos altos na história e na cultura brasileiras
e merecem que os conheçamos. É aqui que todas as alternativas estão em
aberto para os educadores a partir da Lei 10. 639.

Se no Brasil não fomos educados como uma nação multicultural e pluriétnica,
precisamos concentrar esforços para ampliar o olhar para além do negro
escravo e reconhecer o valor daqueles afro-descendentes em âmbitos como a
literatura, a música, as artes cênicas, as artes plásticas, as ciências, a
medicina, o jornalismo, a diplomacia, a guerra, a política, a religião. É
o conhecimento da história real que, enfim, ainda precisamos resgatar. Há
dezenas de personalidades, passagens históricas e obras relacionadas à
cultura afro-descendente que, se conhecidas, mudarão a perspectiva que temos
sobre o povo brasileiro e que foram construídas com explícita parcialidade e
má fé pela historiografia oficial. A Lei 10.639 nos oferece um caminho
possível para sairmos dessa situação e lançarmos um olhar positivo sobre a
nossa herança afro-descendente.

O historiador e romancista Joel Rufino dos Santos, no prefácio de A mão
afro-brasileira – Significado da contribuição artística e histórica
[2]< http://mail.google.com/mail/?ik=f09f545a23&view=cv&search=inbox&th=114a96bd678f1f9a&ww=1003&lvp=2&cvp=2&qt=&zx=7zz827-s49c26#_ftn2>,
questiona:

O que sucederá – ponhamos como hipótese – se um grupo de pesquisadores
recensear criteriosamente a produção da mão, do cérebro e da alma negras na
construção da civilização brasileira, *exibindo como negro quem negro foi?*

Não só tornará o negro irremediavelmente visível, alçando-o a representante
do país, ao lado do branco, como contribuirá para uma nova definição de
Brasil, convincente para as gerações atuais e mais adequada ao nosso
ingresso no século XXI."

Mas não nos iludamos esperando que outros esquemas prontos cheguem até nós.
Precisamos buscar referências, pesquisar, demandar, estudar, perceber o
nosso entorno, ir além dos livros didáticos, observar e ouvir a expressão da
vida e da cultura nas várias formas em que ela se apresenta em nosso meio.
Os afrodescendentes criaram ativamente o ser brasileiro em sua resistência à
escravidão. Ao olharmos a História do Brasil com essa perspectiva, estaremos
praticando uma ação afirmativa para todos os cidadãos brasileiros.

* *

*** Verônica L. O Maia é graduada em Antropologia pela Universidade de
Brasília; especialista em Arte, Educação e Novas Tecnologias. Atua como
consultora para elaboração de projetos para ongs, artistas, empresas.

Um comentário:

manoel messias pereira disse...

A história que temos conhecimento fundamenta-se no eurocwntrismo. Uma nova história tem de desconstruir e trazer a luz o fim do branqueamento, o culturalismo e ideia de nação forçada por Freire e por fim a necessidade de recontar a importancia dos afros descendentes e indígenas no contexto.E para isto a idéia de que na escola não é lugar de culturar o racismo embora entendemos que a escola ainda é reprodutora da classe dominante. è preciso reorganizar o nosso aprendizado e re-elaborar um novo paradigma ou nova visão de mundo.